sexta-feira, 23 de maio de 2014

Um Cantinho do Mapa

23.mai.2014

Esta noite, ou madrugada para os que não partilham do meu sistema de fuso horário, estava fazendo algo que há muito não fazia com calma: jogar um joguinho. Tratava-se de um jogo de estratégia (Hearts of Iron 3, para os interessados), e neste jogo há um belo mapa do mundo com diversas pequenas regiões assinaladas. Cada cantinho com a sua história…

E foi então que ao dar zoom numa determinada área da Alemanha, me vi de volta a Baden-Württemberg, me lembrando de tantas coisas… Cada região, uma lembrança, cada canto, uma história.

Desde Strasbourg, na França, onde estive com minha família aos 7 anos, logo antes de entrar na Alemanha, rumo a Munique. Karlsruhe, cidade onde morei, base de uma experiência quase inacreditável. Hoje sei que aquela época foi um verdadeiro milagre. Como eu, depois de tantos percalços, dores, fracassos e tristezas, poderia estar num cenário mágico de história, amizade, aventura e tanta, mas tanta beleza? Quanta sorte os céus decidiram me entregar, tanta generosidade e fartura, para alguém tão pequeno, simples e desmerecedor. Um milagre.

Ali em cima, em Mannheim, trabalhava um narigudo que sempre tive na mais alta conta, e que sempre penso não ter tratado da maneira que merecia. Quanto mau-humor o pobre teve que aturar, tantos resmungos e chatices. Hoje vejo a sorte que tive, que sempre tive, não sei como, mas que agradeço e valorizo.
Descendo para Freiburg, me deparo neste singelo mapa com Tubingen. Haviam me dito que era um local pequeno, mas foi grande o bastante para merecer aparecer neste mapinha. De lá este famoso narigudo importou uma esposa extraordinária, séria, trabalhadora, parceira, e dona de um sotaque que ainda a acompanha. Em Freiburg, uma lembrança. Uma festa de aniversário de um alemão, nosso hóspede aqui, nosso anfitrião lá. Pitoresco evento, uma noite acampados, e nos pusemos a caminho de Basel, para a final da Copa. 

No caminho de Basel havia Lörrach. Então apenas um castelo próximo à estrada. A dupla que nos acompanhava se uniu a nós na invasão daquele reduto germânico medieval, e desta invasão roubei essa lembrança. 

Então Basel. Susto, prisão, finalmente a Copa, e uma comemoração memorável por uma vitória sofrida e especial. A Suíça mostrou-se ambígua e incerta. Lá fui ferrenhamente defendido por soldados alemães, quem diria?  Grande orgulho trago deste fato, e uma lembrança especial.



Um cantinho tão pequeno do mapa, como podem caber tantas lembranças? Visões, emoções, cheiros e conversas? Tanta beleza? Um milagre.

Seguindo para Leste, acima de Stuttgart me lembro de Rothenburg ob der Tauber. Uma época quando as coisas eram tão simples, e eu era apenas um simples namorado, perdidamente apaixonado. Tão simples. Lá comprei minhas primeiras espadas, e um grupo de alabardas para amigos especiais que me aguardavam no Brasil, entre feitiços e dragões, entre risadas e abraços, tanta alegria. Como é possível? Um milagre.

Rumo ao Sul, Schwabisch Hall. Pequena demais para este mapa, mas S. Gmund é sua vizinha maior. Uma cidadezinha com mais de setecentos anos, e tanta juventude, tanta beleza. Inúmeras lembranças de bares e pintores, lagos e parques. Igrejas e uma fatia de torta de morango. E Casablanca, claro. Ah, Casablanca, antro de piratas e artistas. E lá estava o Pedrinho.

Depois, Oberstdorf, para onde fomos em busca de neve,e que nos levou ao pequeno vale de Inner Pitztal, Também pequeno demais para o mapinha. Lá conhecemos os Franks e um Sr. Martin, que observava cabritos.

Ali ao lado, Garmisch Partenkirchen, meu destino de esqui com 7 anos, inalcançável em 1975 devido a um desmoronamento na estrada. Nunca esqueci deste nome, e imaginei essa cidadezinha muitas vezes. Mas lá nunca fui.

Por fim, Munich. Bem adequado, pois foi um lugar abençoado. Estive lá de mãos dadas com meu pai aos 7 anos, todo encapotado, morrendo de frio. Me lembro muito dessa caminhada de mãos dadas com meu pai. Que maravilhosa lembrança, que sorte a minha ter podido experimentar essa sensação de segurança, carinho e supervisão. Nada poderia jamais dar errado. Hoje, quando dou a mão às minhas filhas, vejo que a sorte me acompanha, me permitindo proporcionar a elas a mesma lembrança, a mesma sensação. Depois lá voltei, novamente de mãos dadas, e vi corrida de bigas, cervejarias e Ciência girando ao redor de uma bomba V2. Me plantei ao lado de um Messerschmitt 109, e dei uma sonora gargalhada! Como seria isso possível, meu Deus?

Tinha que ser um milagre.