domingo, 18 de abril de 2010

Desenvolvimento e as pererecas.



Saudações meus leitores.

Há muito tempo que não escrevo aqui, vim remover o bolor. Aliás, o tema é bolorento já, aos meus olhos. Desenvolvimento. Este processo que todos dizem desejável, que aumenta nossa renda nacional, que dá a todos melhores condições de vida, melhor educação, segurança e saúde.

Pergunte a qualquer energúmeno capacitado sobre os benefícios do desenvolvimento econômico e receberão respostas efusivas e entusiasmadas. Mas o desenvolvimento tem um preço. Tudo tem seu preço, sempre. Neste caso o preço é bastante visível, e algo duro de engolir. Precisamos de recursos naturais. Precisamos de energia. Precisamos de indústrias de transformação.

Recursos nosso país tem. Para extrair estes recursos, invadimos e agredimos a natureza. Ato cada vez mais considerado impopular. Queremos o alumínio, mas vamos extrair a bauxita sem danificar aquele belo riacho ali adiante. E as pererecas que ali procriam? Temos que pensar nisso.

Para energia, precisamos de grandes investimentos e grandes projetos. A bola da vez é a Usina de Belo Monte, que será a 3a maior do mundo depois do gigante chinês das 3 gargantas e Itaipú. Quando completa, vai inundar uma área enorme e desabrigar 22 mil famílias, além de aniquilar parte do habitat de diversas comunidades indígenas.

Nossas indústrias poluem!! Grande novidade não? Ainda não inventaram a siderúrgica não poluente. Mas sem as indústrias nós venderemos bauxita por 1 para comprar alumínio por 15. A grana fica com o país industrializado que banca a poluição.

Bem, não deve haver dúvida de que enumerei aqui 3 atos de vilania ambiental. Destruição para extração, inundação para geração de energia e poluição industrial. O ativista do Greenpeace de plantão pode começar a bufar.

Mas para que o país se desenvolva precisamos disso. Infelizmente os índios terão que se mudar, ou deixar sua cultura perecer. As famílias na região das usinas terão que sair de lá, coisa triste, mas necessária. Num país onde o índice de pobreza é altíssimo, desenvolvimento é a única saída. Devemos usar a preocupação ambiental para tomar decisões inteligentes, que não gerem desperdícios ou agressões desnecessárias. Mas algumas vilanias serão necessárias, e devem ser feitas.

Existe uma massa imbecil esverdeada que prega a preservação acima de tudo. Ora, isto não  é um parque nacional. Isto é um país em desenvolvimento. Quer que não façamos a usina de Belo Monte, como veio aqui cacarejar a múmia azul, então que nos paguem pelo valor de desenvolvimento negado ou atrasado. Que tal 10 Bi por ano durante um século??

Verdes, azuis e rosas, botem uma coisa na cabeça. A idéia do parquinho feliz é muito bonita para um americano limitado como o Cameron. Muito confortável para ele saber que tem aqui no "fim do mundo" uma Amazônia que ficará preservada para que seus filhos venham visitar. Será que ele pensou no impacto ambiental causado pela queima dos 5000 galões de querosene usados para trazer sua carcaça azul para protestar aqui? Duvido.

Quero ver um panaca destes limitando seu estilo de vida pessoal por suas preocupações ambientais. Desmontando sua mansão para permitir o retorno da mata nativa californiana. Cancelando suas viagens de turismo e panfletagem colorida para reduzir a poluição atmosférica. Não se iludam, leitores, esses caras são tão vazios quanto suas propostas. E tão egoístas quanto, também.

A feliz hipocrisia dos desenvolvidos e seus respingos verdes tropicais pode ser explicada facilmente por uma única e sempre presente questão. Dinheiro. O desenvolvido quer continuar comprando silício e vendendo chip. Comprando bauxita e vendendo alumínio. Cada passo que o Brasil dá rumo ao desenvolvimento é um passo de um concorrente potencial se aproximando deles, os desenvolvidos. A verborragia verde é apenas mais uma ferramenta de atraso. Quanto mais eles nos atrasarem, mais lucram.

Prova de nosso incômodo gerado é nossa indústria aeronáutica. A Embraer vende aviões pro mundo todo. Os desenvolvidos aplaudem e acham bom? Muito ruim hein?!  Os caras nos processam quando podem, copiam nossos modelos (Super Tucano) e rezam para nossa volta à indústria cafeeira.

Ouço sempre o conto de que os brasileiros são muito bem recebidos lá fora. Que povo pacífico, como nunca incomodamos ninguém... À medida que nosso desenvolvimento aumentar esta percepção diminuirá. Quando as nossas multinacionais forem explorar a mão-de-obra lá, e nossos produtos causarem desemprego lá, vejamos então como nos admiram.

Hipocrisia é triste. Vamos olhar para o país, fazê-lo crescer e enriquecer (me desculpem aqui os índios e demais comunidades prejudicadas inicialmente pelo processo) e depois, quando investirmos pesado em educação, vamos deixar esses gringos para trás!

Mas atenção, para chegarmos vivos a este patamar temos que nos armar até os dentes. Nossos vizinhos do norte costumam tratar de incômodos de forma usualmente violenta...  E vamos nos tornar incômodos, se tudo correr bem. O Brasil vai deixar de ser popular para ser... Rico!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Filomena (primeira parte).

Conto exemplar.
Eu conheci a Filomena numa aula de ginástica para grávidas. Hoje eu não entendo o que eu estava fazendo ali, mas na época era moda, todo mundo fazia, e se todo mundo faz, é que deve ser bom, não é?
Bom, pelo menos para mim não foi.
E foi a Filomena que me salvou. Imagina, a professora estava naquela história de senta e levanta, senta e levanta, e eu sentei e não levantei mais. Eu estava me sentindo tonta, e a tonta da professora insistia:
- Levanta, menina, vamos lá! Deixa de preguiça!
E eu, que sou obediente, levantei e sentei de novo sem querer, e tudo foi ficando escuro, e eu fui caindo...
Quem me segurou foi a Filomena. E foi logo dando uma bronca na professora:
- Ô Kátia, não está vendo que a menina está passando mal? Não tem competência pra ser professora não?
Saí da aula com a Filomena, que me pagou um suco de laranja. Nunca mais voltei para a Ginástica de Grávidas, mas arrumei uma amiga. E passei a me encontrar todos os dias com a Filomena para andar na praia. Esse foi o nosso exercício de gravidez. Na revista Cláudia que eu li no cabeleireiro diz que também é uma boa forma de exercício, que aumenta as endorfinas.
A Filomena era muito divertida. Falava muito, falava alto, falava um monte de palavrão. Meu pai sempre me proibiu falar palavrão. Ele também falava, de cada duas palavras cinco eram palavrões. Ele era homem, não tinha problema, né? Mas mulher falando palavrão é muito feio. Uma vez lavou a boca da minha irmã com sabão. Não deu muito resultado não. Até hoje ela é desbocada.
A Filomena, com os seus palavrões, me divertia. Ela é uma pessoa de muita personalidade, muito intensa, e eu admiro isso. Quando a gente ia num restaurante, ou numa lanchonete, ela sempre fazia valer os seus direitos (era assim que ela dizia). Reclamava, brigava com o garçom, chamava o gerente. Uma vez chegou a jogar um prato no chão, porque o bife estava muito bem passado, e ela só gosta de carne sangrenta. Eu confesso que fiquei meio assustada, mas depois até ri e falei para ela:
- Você hoje está o cão que o diabo amassou, hein?
Eu adoro usar esses trocadilhos populares. Eles dão um ar intelectual à conversa, e mostram que a gente tem cultura.
Aos poucos eu fui conhecendo melhor a Filomena. Imagine que ela antes de casar tinha sido piloto de avião! Sabe aqueles aviões pequenos, que as pessoas ricas alugam para não viajar misturadas com as pessoas comuns? Pois é, por incrível que pareça, a Filomena pilotava um avião desses. Que eu saiba, foi a única mulher aviadora da história. Vê como ela tinha personalidade?
Aliás, foi pilotando que ela conheceu o marido, que é empresário. Ela foi contratada para levar um grupo de industriais para visitar uma fábrica no interior, e aí tudo aconteceu. Eu suspirei quando soube.
Já pensou que romântico? Eu imaginei tudo: enquanto o avião atravessa aquele céu de brigadeiro (mas um brigadeiro azul, não cor de chocolate), ele, de terno, pasta de executivo, óculos escuros, um charme, desliga os cinco celulares (ele tem cinco, eu vi), fecha o laptop, e de repente faz uma declaração de amor no ouvido dela. E ela, tomada de paixão, mergulha o avião numa manobra ousada, rasgando as nuvens como quem rasga um sutiã. Confesso que tive inveja, que Deus me perdoe (sei que a inveja é um pecado muito feio, e as pessoas usam uma palavra ainda mais feia para falar de inveja).
É claro que o marido da Filomena exigiu que ela deixasse a aviação quando se casaram. Está certo. Mulher de empresário tem que ficar em casa cuidando dos filhos, dando ordens às empregadas, preparando a casa para as recepções dos homens importantes que vão fazer negócios com o marido. Confesso que mais uma vez tive inveja. Às vezes eu vejo o meu marido no sofá, de pijama, tomando cerveja enquanto vê o jogo do Flamengo, e penso que se eu tivesse casado com um empresário não precisava trabalhar. Mas, enfim, cada macaco no seu galho. Cada cabeça, uma sentença. Nem todo mundo tem a mesma sorte.
Nossos filhos nasceram, com um intervalo de uma semana, o dela primeiro, o meu depois. O Paulo Henrique, meu filho, era uma gracinha. Até hoje. O filho dela, o Cauê, também era um bebê muito bonitinho. E a nossa amizade foi aumentando.
A gente levava os nossos bebês nos carrinhos para tomar o sol da manhã na praia (dizem que faz muito bem aos ossos). Era uma delícia. Às vezes, ela se aborrecia com os ciclistas. Um dia ela chegou a derrubar um rapaz de uma bicicleta, porque ele passou bem perto do carrinho do Cauê. Ah, eu esqueci de dizer, ela é muito alta e forte, muito diferente de mim, que sou baixinha e franzina. O rapaz levou um susto. Quando viu aquele mulherão gritando com ele, xingando de todos os palavrões, subiu rapidinho na bicicleta e deu o fora. Quando um não quer dois não brigam (sem querer ostentar conhecimento, aí vai, humildemente, mais um trocadilho popular).
Eu falei que o Cauê era muito bonitinho. Ele era mesmo. Mas à medida que foi crescendo, foi ficando meio nervoso. Acho que ele puxou ao gênio da mãe. O que deve ser bom. Ele deve se tornar um adulto decidido também.
O problema é que toda vez que a gente se encontrava ele enchia o meu filho de bolacha. E a mãe não fazia nada. Eu tratava de tirar discretamente o Paulo Henrique do caminho. Quando dava.
Como falava o meu pai, a gente só deve andar com boas companhias, e eu faço questão de criar o meu filho de acordo com essa orientação. O Cauê é filho de pais que tem dinheiro, são bem situados na sociedade. Enfim, uma boa companhia. Bater no meu filho é um mal menor. A gente contorna.
O tempo foi passando, os filhos crescendo. Eu convivia muito com a Filomena e o filho. Às vezes a gente ia à praia, e o meu marido ia também. Mas nós não conhecíamos o marido dela. Ele é um empresário importante, tem umas fábricas não sei de quê, trabalhava muito, estava sempre viajando.
A Filomena passou a se queixar muito. Dizia que o marido quase não ficava em casa, que não dava atenção para ela e para o filho, que saía para jantares de negócios e muitas vezes só voltava no dia seguinte, que quase não conversava com ela. Eu explicava a ela que a vida de um empresário deve ser muito difícil, que ela tinha que ter paciência. E ela sempre terminava lembrando os tempos de aviação, e me contava da sensação de liberdade que tinha no céu, pilotando seu avião.
Num dia ela chegou a me dizer que tinha outro problema com o marido, mas que não ia me contar, porque era uma coisa muito íntima. Apesar da curiosidade, eu não insisti no assunto. Sabe como é, mais vale um pássaro na mão que dois voando. Eu não queria perder a amizade dela.
Eu dizia para ela que eu queria conhecer o seu marido, apresentá-lo ao meu marido. Quem sabe, com uma boa conversa de empresário, o Leonardo ensinava o Pedro Paulo a ganhar dinheiro? Como eu já falei antes, eu sigo a orientação do meu pai, de andar sempre em boas companhias. Afinal, o hábito não faz o monge.
Um dia, a Filomena veio com a boa notícia. O marido tinha aceitado ir para um hotel fazenda com a gente. O preço era meio salgado, mas eles dividiam em 12 vezes, de forma que nós podíamos pagar.
E assim fomos nós, passar o fim de semana em Resende, com o Leonardo, a Filomena e o Cauê. O Pedro Paulo brincou, dizendo que ia botar uma roupa de futebol americano no Paulo Henrique, porque assim, quando o Cauê batesse, o Paulo Henrique estaria mais protegido. Eu disse a ele que não tinha gostado da brincadeira. Lembrei que eu tinha, pela minha facilidade de fazer amizades, conseguido me relacionar com pessoas de categoria, e que era bom para o nosso filho conviver com um menino que tinha nascido em berço de ouro.
O Cauê só era meio nervoso, só isso. Eu nem liguei quando, numa visita, ele quebrou uns três ou quatro bibelôs na mesa da nossa sala. Coisa de criança. Se conselho fosse bom, macaco não punha a mão em cumbuca. Eu sou muito compreensiva.